Samora Correia – Perante um céu estrelado em Erra, tenho de endereçar os meus parabéns a Lucas Gonçalves!

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Dia muito quente, noite de Verão! Realizou-se nesta segunda-feira a tradicional corrida de toiros, por ocasião das festas em honra da Nossa Senhora da Oliveira e da Nossa Senhora de Guadalupe, em Samora Correia. Um festejo, em formato de concurso de ganadarias, com os seguintes ferros a disputar o prémio para melhor toiro: Herds. Paulino da Cunha e Silva, Vale Sorraia, Manuel Assunção Coimbra, Canas Vigouroux, Alves Inácio e Lopes Branco (que substituía a rês de Fernandes de Castro, que se lesionara aquando do embarque), sendo o júri composto pelos maiorais das ganadarias representadas.

Filipe Gonçalves, enquanto diretor de lide, teve a incumbência de inaugurar as funções equestres. Lidou, inicialmente, o astado de Canas Vigouroux, rematado de carnes, que denotou pouca mobilidade e um momento da reunião complicado pelo facto de ser tardo de investida e apenas se arrancar quando via que podia atingir a montada. A mansidão, nesta situação, não levou a rês a fechar-se em tábuas, levando, contudo, o ginete a ter que ‘pôr a carne no assador’ para deixar a ferragem da ordem. Lide razoável, que nunca atingiu patamares de destaque, não lhe tendo sido concedida música por parte da ‘inteligência’. Completava o lote do ginete algarvio o toiro da ganadaria de Herds. Paulino da Cunha e Silva, negro bragado corrido de capa e que desde cedo denotou pouca fijeza. Essas características foram-se diluindo durante a sua estadia em praça, tendo permitido que o cavaleiro apostasse em cites de largo, carregando em velocidade sobre a rês, batendo-lhe de forma acentuada ao pitón contrário para culminar com a cravagem das bandarilhas. O primeiro (que lhe valeu, e bem, música por parte da direção) e o terceiro (o melhor da sua noite) foram de destacada nota, perfilando-se pela negativa o momento da segunda bandarilha curta da série, que resultou descaidíssima após um momento da reunião completamente desajustado. Terminou a sua passagem por esta localidade com um ferro em sorte de violino seguido de um palmito e de um par de bandarilhas, sorte na qual é exímio executante, não deixando, nesta ocasião, créditos por mãos alheias.

O segundo cavaleiro em praça foi Miguel Moura, tocando-lhe em sorte, o astado da divisa Lopes Branco. O toiro tinha as suas teclas porém o cavaleiro não o entendeu na perfeição. Foi uma lide pautada pela regularidade, sem que, contudo, chegasse a conseguir romper em bom. Não se justificava a concessão de música face ao sucedido até ao segundo curto, tendo por base, o critério usado na lide anterior (deveria ter sido concedida após o quarto ferro curto). No último terço da sua atuação, o ginete de Monforte colocou em prática a sua brega de qualidade, trazendo o oponente à garupa da sua montada, ladeando com boas maneiras, cravando a quarta bandarilha curta, em terrenos de dentro, numa execução de boa nota. Encerrou com a cravagem de dois palmitos, o segundo dos quais após ter passado em falso, na tentativa inicial. O toiro que saiu em quinto lugar foi da divisa de Manuel Assunção Coimbra. Desde o primeiro comprido que se viu a fraca potabilidade do mesmo para a função. Sem reagir ao momento da ferragem, parado, paradinho… nos médios! Limitou-se o toureiro a cumprir o seu labor, não tendo qualquer hipótese para brilhar. Foi-lhe concedida música para premiar a resiliência que teve ao nunca baixar os braços perante tal matéria-prima.

Completava a terna o cavaleiro praticante Tristão Ribeiro Telles. Enfrentou-se com um toiro de Alves Inácio, que foi claramente o que mais mobilidade exibiu na primeira parte do festejo, podendo-se, contudo, referir que se adiantava ligeiramente às montadas. Iniciou com um comprido à tira, de excelente nota, após citar praça a praça, naquele que foi o momento alto desta sua lide. No que à ferragem curta diz respeito, referir que nos dois primeiros da ordem, cuja abordagem foi frontal com cravagens ao estribo, consentiu forte toque na montada, no momento da segunda bandarilha. O terceiro curto foi cravado após bater de forma acentuada na cara da rês, sendo a bandarilha curta mais destacada da sua primeira passagem por este tauródromo portátil. Aquando do quarto curto, o momento da reunião não foi bem medido, sendo o toureiro fortemente abalroado, com algum aparato, conseguindo, todavia, aguentar-se em cima da montada, não resultando, aparentemente, deste incidente consequências de maior. O último da noite pertencia à divisa Vale Sorraia, mostrando-se reservado e distraído, com investida pouco franca, arreando sempre que via possível alcançar o artista. Após algum desacerto no momento da cravagem, o cavaleiro da Torrinha deixou aquele que foi o mais arrojado e impactante ferro da noite, numa reunião que resultou cingidíssima, após batida ao pitón contrário, a altíssima velocidade.  Lide meritória, porém com oscilações qualitativas ao longo da sua estadia na arena, agradando ao público que preencheu cerca de dois terços da capacidade deste recinto.

As pegas da noite estiveram a cargo de duas formações, os grupos de forcados amadores de Vila Franca de Xira e do Ribatejo.

Pela formação vilafranquense, o cabo Vasco Pereira começou por eleger o forcado Rodrigo Andrade que começou a citar nos médios com tranquilidade e postura toureira, carregando a sorte por três ocasiões consecutivas, conseguindo, desta forma, captar-lhe a atenção e fazê-lo arrancar-se. O momento da reunião foi eficaz, e nem o facto da rês ter fugido ao grupo fez com que o forcado da cara tivesse dificuldade em se fechar, numa viagem aparentemente tranquila, consumando desta feita ao primeiro intento. Miguel Faria teve a tarefa de pegar o terceiro da corrida. À primeira tentativa revelou alguma insegurança no cite, tendo no momento da reunião o oponente tocado os seus joelhos, deixando-o imediatamente ‘por terra’. Na tentativa seguinte e após citar de forma mais afirmativa e convicta, o astado fez um ‘feio’ na reunião, não permitindo que se fechasse. Efetivou ao quarto intento, não se podendo retirar as responsabilidades ao forcado da cara, dado que nas tentativas falhadas, nunca o toiro chegou à primeira ajuda. O Miguel é um jovem forcado que certamente irá analisar os seus lapsos, corrigindo-os, de forma a poder almejar o sucesso numa próxima ocasião. Para fechar a prestação do grupo foi indicado o forcado Lucas Gonçalves. Que pega monumental! O astado, perdido de manso, que nunca humilhou, arrancou-se mal viu o homem e foi bruto na viagem, fugindo aos restantes elementos da formação na chegada aos tércios, com uma mudança de direção repentina, saindo solto para a zona das trincheiras onde o grupo conseguiu, posteriormente, ajudar. Que alma e raça deste jovem, que aliado à técnica e demonstração de vontade, afirma-se corrida após corrida, como uma das primeiras linhas desta formação. Olé Lucas!

Pelos amadores do Ribatejo, o cabo Pedro Espinheira, começou por fazer avançar na linha da frente o forcado Fábio Delgado. Pega consumada à primeira tentativa, numa execução onde o astado não lhe apresentou dificuldades de maior e o grupo acabou por auxiliar a consumação com a coesão desejada. A quarta pega da noite teve como forcado da cara, Leandro Catrapolo. O jovem forcado esteve enorme desde o cite até ser sacudido de má forma, após uma viagem atribulada, onde aguentou derrotes de todo o tipo. A reunião não foi perfeita, todavia a pega não é consumada na tentativa inicial, dada a inércia e reação pouco fluída dos elementos que o acompanharam. A efetivação da sorte deu-se ao quarto intento a sesgo e com ajudas carregadas, após duas tentativas onde não se podem isentar as culpas ao primeiro ajuda, que ficou mal na fotografia. A margem de progressão é também, nesta situação, grande, devendo olhar-se ao que se fez mal para melhorar numa próxima oportunidade. A última pega da noite esteve destinada a Fábio Casinhas. Consumação limpa ao primeiro intento, após reunir com a eficácia esperada e o grupo ter ajudado com afinco.

Foi atribuído o prémio de melhor toiro, por unanimidade, ao toiro com ferro coruchense de Lopes Branco, que curiosamente não se encontrava inicialmente anunciado e cujo solar do efetivo desta ganadaria sita em Pé d’Erra – Coruche, localidade vizinha à qual no mesmo dia foi a sepultar o pai do nosso João Dinis! Pensei toda a noite na melhor maneira de te poder, aqui, deixar um abraço de coragem e força e não é que, sem nada o fazer prever, surge uma coincidência destas que me facilita a vida?! Erra estará hoje bem estrelada e a olhar pelos seus, tanto na terra como nos céus. Que em paz descanse!

Corrida dirigida pelo delegado técnico tauromáquico Fábio Costa, assessorado pelo médico veterinário Dr. Jorge Moreira da Silva e pelo cornetim José Henriques.

Foto: Rodrigo Viana

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