Chamusca – Como ouvi alguém dizer: “que venham mais 50”!

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Antonio Timóteo, Manuel João Valério, José Ferreira, Nuno Quito, Nuno Marques e Nuno Marecos são nomes de muito peso na formação que hoje comemora o seu quinquagésimo aniversário de fundação. Os cabos têm o dever de comandar um grupo de homens, ensinando-os, corrigindo-os, dando-lhes elogios e criticando quando é necessário de forma a potenciar as qualidades de cada um, em prol do sucesso do grupo. Por esse motivo, como é evidente, muitos outros nomes de forcados poderiam ser nomeados, por tudo aquilo que foram, dando de si, para que os amadores da Chamusca sejam, nos dias que correm, uma formação respeitada e com selo de qualidade no panorama taurino nacional. A primeira pega da tarde esteve a cargo do atual cabo, Nuno Marecos. Na primeira tentativa não foi eficaz no momento da reunião, hipotecando por completo a possibilidade de consumação. À segunda, reuniu como é seu timbre, fechando-se e aguentando os dois derrotes laterais a que o toiro o sujeitou, tendo os restantes elementos ajudado de forma competente nos médios. Seguiu-se o anterior cabo, Nuno Marques. Brindou ao seu filho, que nesta pega desempenhava o papel de rabejador, citando com toda a classe e categoria que o personificam. Avançou a passo, carregou no momento ideal, reunindo a preceito. Ao sentir o forcado, o astado derrotou de forma violenta, impedindo, desde logo, que se enganchasse e consequentemente a respetiva efetivação. Na segunda vez que lhe bateu as palmas, adiantou-se ligeiramente no momento de reunir, saindo algo combalido da tentativa. Concretizou ao terceiro intento com ajudas mais carregadas. Francisco Rocha avançou para pegar o terceiro da tarde. Pegão ao primeiro intento, conseguindo fechar-se como uma lapa e não permitindo qualquer veleidade à rês. Os restantes elementos não conseguiram impedir que o toiro fugisse à chegada às tábuas da trincheira chamusquense, não tendo a situação impedido, ainda assim, a consumação por mérito, essencialmente, do forcado da cara! A quarta tentativa de pega de caras esteve destinada ao antigo elemento da formação, Vítor Rosa. Quem sabe, sabe e nunca esquece! Esteve valente e acima de tudo competente desde que saltou ao ruedo. Pega tecnicamente perfeita, do início ao fim, culminada com uma forte e merecida ovação e duas voltas de agradecimentos (a segunda, das quais, sozinho). Para pegar o quinto da ordem, foi indicado o forcado Luís Isidro, que também já se encontra retirado das arenas. Esteve possante no cite, fazendo-se ouvir mas teve azar, dado o forte derrote que lhe foi imposto. Uma voltareta muito feia, seguida de uma outra investida, quando o forcado tentava fugir, levaram a que caísse, aparentemente inanimado e muito mal tratado, sendo retirado de imediato para a enfermaria. Coube a Miguel Santos dobrar o colega e executar uma brilhante pega ao segundo efetivo intento, aguentando a longa viagem, mesmo quando os terceiras ajudas não conseguiram colaborar com a eficiência que se pedia. Fechou a tarde de comemoração, o jovem forcado Afonso Aranha. Citou com calma, pecando apenas no momento de carregar a sorte, visto o novilho estar naquele momento a raspar e, por esse motivo, não estar “em sorte”. Ainda assim, conseguiu reunir de forma eficiente, concretizando uma pega limpa à primeira tentativa.

Rui Salvador que realizava aquela que provavelmente será a antepenúltima corrida da sua carreira, brindou ao grupo local e a um dos mais destacados cavaleiros amadores, que hoje se estreia numa corrida de toiros e que poderá vir a singrar nesta bonita função, Vasco Veiga. O Santa Coloma que lhe tocou em sorte, pertença da ganadaria Vinhas, estava rematado, embora tivesse alguma falta de força nos membros, situação mais visível no primeiro tércio, vindo em crescendo comportamental com a sua estadia no ruedo. A fase de compridos não resultou de feição ao ginete radicado em Tomar, havendo alguma falta de sincronismo entre o binómio que se enfrentava. Para a série de curtos e com a mudança de montada, houve muito mérito e a lide atingiu patamares superiores. Houve cuidado na preparação das sortes, facultando-se o tempo necessário para que o animal pudesse respirar e investir em pleno. Bregou com qualidade e cravou com saber, destacando-se a segunda e terceira curtas. Sendo o toureiro que mais atuou neste tauródromo, foi muito acarinhado, saindo sob forte ovação do conclave.

O segundo da ordem de lide pertencia à ganadaria Passanha e teve por diante o cavaleiro Luís Rouxinol. E que forma de começar! Aguentou a investida do oponente e cravou um comprido de muito mérito, causando impacto imediato nas bancadas. A rês esperava e arreava quando via que podia atingir a montada, o que motivou um sobressalto aquando da cravagem do terceiro comprido. O momento de reunir não foi bem medido pelo ginete de Pegões, havendo lugar a um forte toque na montada, que afortunadamente não terminou com uma colhida. A série de curtos foi competente, tendo o cavaleiro exibido as credenciais que possui, mostrando um entendimento em crescendo do toiro o que possibilitou lograr a cravagem de boas bandarilhas curtas. Terminou a sua passagem pelo coração do Ribatejo com um ferro de palmo de boa nota.

A primeira parte do festejo teve como protagonista final o cavaleiro Duarte Pinto. Enfrentou o toiro com ferro de José Luís Vasconcelos e Souza d’Andrade, mosqueado e capuchinho de capa e que pela sua pelagem motivou ruído entre os espetadores. Em termos comportamentais nunca abriu, resguardando-se e investindo para fazer mal. Os terrenos tinham de ser bem escolhidos e o momento de reunir bem medido para que o resultado fosse positivo. A cravagem do primeiro curto foi de muito valor, havendo cingimento entre a montada e o astado. Aquando da tentativa de cravagem da segunda curta da série foi tocado, passando em falso, o que veio a suceder mais a frente aquando da tentativa de cravagem da quarta bandarilha. Terminou a sua atuação apontando ao toiro, enquanto olhava o público, justificando dessa forma uma atuação que acabou por não redondear.

A António Prates tocou-lhe em sorte o toiro da ganadaria Fernandes Castro. Saiu mirando tudo à sua volta, e forçando o ginete após duas tentativas goradas a impelir a ferragem da primeira bandarilha comprida da atuação. Foi dificil a tarefa visto que o oponente em nada colaborou com o sucesso artístico do jovem cavaleiro, o que eleva o resultado alcançado e permite questionar o prémio bravura entregue pelo júri. Teve paciência, preparou a sorte com saber e cravou um primeiro curto de nota considerável, em sorte com reunião cingida e com impacto. Após um momento de menor inspiração com a segunda curta da série, aguentou uma longa e enraçada investida do manso encastado que lhe fora sorteado, deixando-o nos tércios e conseguindo uma sorte de muito boa nota. Encerrou a sua atuação com a cravagem de dois palmitos, o primeiro dos quais em sorte de violino que muito agradaram o público que preencheu cerca de dois terços fortes do recinto.

O quinto a sair dos currais era pertença da ganadaria Murteira Grave. Cornicurto e de apresentação q.b para aquilo que é uma corrida em formato concurso de ganadarias, denotou pouca mobilidade, havendo ainda assim condições de lide e teclas por onde António Ribeiro Telles filho pudesse tocar. O ginete da Torrinha mostrou-se capacitado na fase de compridos, almejando a cravagem de dois ferros desta tipologia de muito boa nota, suportando a impetuosa investida do oponente. Após trocar de montada teve um momento de menor inspiração, passando por um par de ocasiões em falso, o que levou a uma quebra do ritmo que a sua faena trazia, o que voltou a suceder no momento que antecedeu a terceira da série. A efetiva consumação da cravagem dos três curtos com que terminou a sua atuação é de louvável registo e de levantar praça, dado o cingimento no momento da reunião. Pode-se descrever esta atuação, de forma metafórica, como o atravessar de um rio entre duas montanhas, visto que houve um inicio e fim de bastante qualidade e uma fase intermédia onde a quebra foi uma realidade.

Foi com três voltas completas a galope e com o novilho da ganadaria de São Marcos a apertar que se deu início à lide do cavaleiro amador Vasco Veiga, obtendo a primeira calorosa reação do público. Está muito bem montado, exibiu boas maneiras embora alguma pressa e velocidade excessiva inicial, fruto da pouca experiência. Veio-se confiando, conseguindo desfrutar das qualidades do oponente que lhe coube lidar e conseguindo mesmo a cravagem de três curtos de muita qualidade, no caso, o primeiro, segundo e quarto da série. Perante o que vi e sendo exigente na análise, como gosto de ser, posso dizer que não ficou atrás de nenhum dos seus alternantes. Terminou a sua atuação com um ferro em sorte de violino com o público de pé a aplaudir de forma merecida o seu labor.

Os prémios apresentação e bravura, esta tarde, em disputa, foram entregues, respetivamente, à ganadaria José Luís Vasconcelos e Souza d’Andrade e Fernandes de Castro.

A corrida foi dirigida pelo delegado técnico tauromáquico Manuel Gama, assessorado pelo Dr. Feliciano Reis. A exigência como, infelizmente, vem sendo hábito nos tauródromos nacionais foi, nalguns casos, mais uma vez desprezada, preferindo eu, hoje, por ser dia de festa, remeter-me ao silêncio em relação ao facto em apreço. Porque no final do dia, o que mais importa, é que a festa foi bonita e que venham de lá mais 50!

Foto: Rodrigo Viana

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