É assim o povo português, o mesmo que idolatra a saudade, não a consegue sentir e valorizar no seu mais íntimo significado…
A saudade que nos faz recordar os fados de Amália ou os golos de Eusébio, revela-se ofuscada na hora de valorizar a longevidade assumida de Cristiano Ronaldo. Quando insiste em não abandonar o futebol, suscita reclamações diversas a que por vezes e alguns apelidam de egocentrismo incapaz de abandonar os holofotes da ribalta. Por entre elogios rasgados, aconselha-se a sua saída como a única salvação de uma carreira única e inigualável. O mesmo “público” que o idolatrou, foi e é capaz de o mandar embora… Mentes perversas, incapazes de entender que há personagens que não têm tempo, não têm prazo e não são casos comuns…
Há Figuras, cujas trajetórias têm de viver de análises distintas porque também elas são diferentes.
Voltemos à essência do povo português e à capacidade de aliar a saudade ao esquecimento célere dos méritos logrados. A tauromaquia não é diferente das restantes áreas sócio-culturais.
Vejamos.
João Moura, um dos casos mais comparáveis com o duende de Cristiano Ronaldo. O que ouve constantemente? Lixo verbal!
Um dos primeiros sites de temática taurina, se não mesmo o primeiro dentro dos preceitos que se exige a um órgão de comunicação, suspendeu a sua actividade. Falo do “Toureio”, de Hugo Calado. Que manifestações houve que espelhassem algum transtorno? Zero!
Um programa de rádio singular e à vez de importância inegável, que aproximava a tauromaquia dos emigrantes amantes da arte e tradição do seu país, de Luís Sarmento, “calou” a sua transmissão. Reacções? Zero!
O programa também ele de rádio da estação portalegrense, do saudoso Lourenço Mourato. Calou-se pouco depois da sua partida. Alguém lamentou? Zero!
As praças de touros de Setúbal, Póvoa de Varzim, Albufeira, Cascais, Espinho, Viana do Castelo e tantas alentejanas, fecharam portas. O que se fez? Zero!
Mais e noutro contexto.
Proliferam empresários sem experiência, cuja única intenção é aparecer, existir socialmente, provar a sua solvência propagandeando uma conduta diferente, verificando-se para pior e o que se faz? Zero!
O Campo Pequeno reduz em pouco tempo o número de corridas, passando a não existir como temporada, existindo apenas como eventuais eventos dentro da eventualidade dos compromissos do empresário e suas alianças e o que se faz? Zero!
Uma novel empresa promete mundos e fundos, sorteia carros como se isso mudasse os quilates da qualidade do festejo. Ficamos como? Felizes!
O matador de toiros que se conserva “imortal” e viveu anos a não arriscar um “pêlo” é considerado o melhor, quando à confraria que misteriosamente o mantém ao comando do seu leme deixou durante algumas temporadas prejuízos elevados. O que pensa? Que é o melhor.
As manifestações pró-touradas que se organizam e não aparece ninguém, o que se pensa? Normal.
Um site que existiu durante anos e a quem todos deram crédito, viveu apenas e só porque teve na sua génese fundos comunitários que mal terminaram o seu efeito, fechou portas e diz continuar apenas em redes sociais. Um site que vendia publicidade, cartazes e toureiros no mesmo pacote, contrariando todas as regras do jornalismo. O que se pensa? Normal.
Toureiros que se sobrevalorizam e não vêm o que é visivelmente ofuscante. Não colocam na praça em bilhetes vendidos metade dos cachets cobrados. Alguém lhes diz isto? Ninguém.
Cronistas que escolhem palavras na hora de avaliar resultados artísticos, com medo de levar uma “bordanada” dos serviçais dos toureiros e o que se pensa disto? Evolução.
Um país onde da grupeta que o defende taurinamente falando, ninguém sabe nada, mas que recebe comissões dos artistas e empresas para exercer um labor até agora invisível. O que se pensa disto? Normal.
Um blog que diz e se comporta como se mandasse em tudo isto, que muda de opinião a cada duas horas conforme toca o telefone trazendo na volta do correio as suas compensações, que ousa insultar tudo e todos, que julga que a sua presença ou ausência influenciam quem quer que seja, o que consegue? O seu contrário. Praça cheia em Vila Franca.
Um empresário que há quase vinte anos gere o tauródromo da sua terra, que tem categoria, problemas financeiros sim, mas que nunca deixou passar mal a “sua” Palha Blanco. O que se pensa? Já vai tarde…
Queremos o quê em Vila Franca? Uma empresa em que o empresário passa a corrida a comer pipas largando-as para o chão, que diz, ou dizem os seus pares que o toureio a pé não leva pessoas às praças e que só conhece certo nível de espetáculo. É isto que é o ideal para Vila Franca?
Pois bem. Antes que me digam ou sequer pensem que sou amiga de Ricardo Levesinho, deixem-me dizer que sim, sou, gosto imenso do Ricardo e do irmão, que sim, temos um acordo publicitário que nem sempre foi cumprido com todos os seus pressupostos, que sim o diálogo nos fez superar tudo e a educação imperou sempre… mas sobretudo sim, Vila Franca fica a perder e muito com a sua saída. Com o único último grande empresário tauromáquico português.
Mas Portugal é isto!
Pois bem, que se idolatre o generoso e romântico Rui Bento; que se ovacione o Farpas e as suas mudanças de opinião de meia em meia hora; que se coloque o monopólio nas mãos dos “Samueis”; que se leiam as crónicas isentas nas redes sociais fingindo-se que são órgãos de comunicação; que se aplauda a grande (em número) temporada lisboeta; que se continue a pisar no toureio a pé; que se continuem a achar que os espanhóis podem fazer o que querem por aqui; que se continuem a aplaudir os cartéis de seis ou sete artistas; que se continuem a não organizar novilhadas; que se continue a fazer festivais sem interesse; que se continue a falar à boca pequena das praças que não existem e um dia foram grandes; que se continue a descontar para uma defesa da festa que defende pouco… Continuem a achar que somos nós os amargurados da Festa e um dia corremos o risco de dar uma notícia que não queremos dar…