A corrida de toiros mista do Município ficou, nesta noite de terça-feira, incontornavelmente marcada por um triunfo rotundo do novilheiro vilafranquense Tomás Bastos, com honras de saída pela Porta Grande da Praça de Toiros Daniel do Nascimento.
O Tomás nasceu e cresceu numa família de toureiros, é humilde (característica que falta a muito boa gente da nossa festa), mostra uma maturidade gritante, é inteligente na análise que faz aos novilhos, na escolha dos terrenos, no tempo que lhes concede para que não se esgotem. Ao ler poderá parecer que me encontro a retratar o perfil de um maestro mas na verdade refiro-me a um jovem de apenas 16 anos.
Faz 39 anos e 22 anos, respetivamente, que Mário Coelho e Pedrito de Portugal estoquearam toiros, exatamente nesta mesma data, no referido tauródromo e hoje, curiosamente, voltou a fazer-se história no importante tauródromo, bem cuidado, situado na Moita do Ribatejo.
Quanto à atuação do jovem novilheiro há a referir que iniciou de capote com dois quites vistosos, um por verónicas, culminado com uma ‘meia’ e outro por gaoneras terminado com uma revolera, que deixaram desde logo água na boca para o que se iria seguir. No tércio de bandarilhas, destaque para a sua postura toureira e para a cravagem dos dois últimos pares, tendo tido o percalço de ser colhido, após o segundo par, ao tropeçar na cara da rês, não havendo felizmente consequências dignas de registo. E o que se seguiu foi de uma classe formidável. A faena de muleta iniciou com três séries pela direita de muito bom gosto, onde não faltou profundidade e entrega total, seguindo-se uma outra por naturais que não saiu tão fluída, dada a pouca transmissão do astado por esse pitón. Face a esta constatação, sobressaiu a sapiência do jovem ao regressar à mão que lhe estava a dar bons frutos para deixar uma série de arrepiar o mais céptico dos aficionados, culminada com um passe de peito, que levantou diria a totalidade do público dos seus assentos. Se isto já era suficiente para se exultar o jovem, ainda teve o desplante de deixar uma série de derechazos de joelhos em terra e outra de manoletinas com uma classe absurda! Van Gogh, Picasso, Dalí, entre muitos outros e cada um no seu estilo, criaram obras e pintaram telas que ainda hoje admiramos. O Tomás, hoje, alumiou na retina de quem o observou ao vivo e a cores uma obra de arte, tão bela como os grandes artistas que enunciei deixaram para muitos dos seus apreciadores. Foi um triunfo contundente que gerou acordo total tanto entre os tendidos como entre barreiras! Haverá, certamente, um futuro risonho para o toureio apeado nacional!
O matador português João Silva ‘Juanito’ face a tudo o que enunciei anteriormente, ficou com uma tarefa hercúlea de se conseguir superar ao compêndio de toureio demonstrado. Frente ao primeiro, e após se luzir de capote por verónicas e gaoneras, desenhou faena interessante, de onde se destacam a segunda série de derechazos e uma de manoletinas na fase final da sua atuação, onde os desplantes de um toureiro mais tremendista não faltaram. O público reconheceu o mérito do matador de Monforte, tributando-lhe uma merecida ovação. Frente ao segundo de seu lote, ‘a música foi outra’, não se mostrando de capote e desenhando uma faena de muleta de menor intensidade, onde conseguiu retirar duas séries de valor pelo pitón direito a uma rês que pouco ou nada transmitia.
O ‘clã Fernandes’ teve esta noite momentos interessantes, sobressaindo o mais novo da família. Rui Fernandes abriu a noite, enfrentando-se com um astado reservado e que obrigou o ginete a pôr bastante de si para que conseguisse transmitir emoção para as bancadas. Com o ‘El Dorado’ desenhou os melhores momentos da sua passagem por este recinto, bregando com qualidade, e cravando uma terceira bandarilha curta de boa nota, após citar em curto, bater ligeiramente ao pitón contrário, culminando com a cravagem en su sítio. Encerrou a sua atuação a solo com uma bandarilha que motivou bastante ruído entre o conclave, mas cuja reunião não fora tão perfeita quanto desejável.
Duarte Fernandes voltou às arenas portuguesas para mostrar que tem carisma para se tornar num caso sério do toureio a cavalo. Após uma fase inicial onde o primeiro curto não lhe saiu de forma ortodoxa, tendo a acentuada batida que realizou, tirado o oponente demasiado para fora no momento da reunião, o que motivou uma sorte de menor valor, o jovem desenvolveu lide em crescendo, ganhando confiança a cada ferro que deixou. O remate das sortes, essencialmente aquele que efectuou após o quarto curto da noite, com duas piruetas ajustadíssimas na cara do oponente, foram a cereja no topo de bolo para que o público reconhecesse o bom momento do ginete, tributando-lhe, de pé, calorosas e carinhosas ovações.
Da lide executada a duo com o seu tio, referir que se vislumbrou uma brega vistosa, que antecedeu a série de curtos, onde foram deixadas quatro bandarilhas curtas, de forma consecutiva e ininterrupta, o que deixou, com certeza os músicos da banda com tendinites nos dedos das mãos. Encerraram a sua lide com dois palmitos, após se adornarem na preparação da sorte.
O grupo de forcados amadores da Moita, como é tradicional nesta primeira corrida da feira, foi responsável pela execução das tentativas de pega. Deixaram uma boa imagem, quer pelo bom trabalho dos forcados de cara, quer pela coesão demonstrada no momento de ajudar. Avançaram na linha da frente o cabo, João Raposo, numa consumação à segunda tentativa, após o toiro ter dificultado na investida inicial e feito com que se desfizesse a pega por um par de ocasiões e quer João César, quer David Solo efetivaram ao bom primeiro intento nas restantes pegas da noite.
O curro de toiros constituído por três toiros de Canas Vigouroux e dois toiros e um novilho de Calejo Pires permitiram um espetáculo agradável, sendo de bandeira o novilho lidado por Tomás Bastos, merecedor de volta ao ruedo e forte ovação dos espetadores, colaborador o segundo e terceiro da ordem de lide, destacando-se pela negativa o que saiu em primeiro e último lugar. Voltas concedidas pela inteligência para os representantes de ambas as ganadarias após a lide do quarto e quinto da ordem.
A corrida foi dirigida pelo delegado técnico tauromáquico João Cantinho, assessorado pelo médico veterinário Dr. Jorge Moreira da Silva e pelo cornetim José Henriques, tendo o público preenchido cerca de meia casa forte da lotação do anfiteatro moitense.