A escassos dias de se enfrentar com seis touros de diversas ganadarias, na importante Feira Taurina da Moita, João Ribeiro Telles concedeu ao TouroeOuro uma pertinente entrevista, abordando o desafio, as expectativas, os sonhos de obter mais um triunfo no tauródromo onde nos últimos anos se tem sagrado triunfador absoluto.
Quinta-feira, dia 14 de Setembro, será um dia a recordar para o dinástico toureiro.
TouroeOuro – João, comemoras 15 anos de alternativa depois de uma temporada onde tens tido boas atuações e alguns triunfos também em Espanha, com saídas em ombros. É um desafio e numa das mais importantes praças do país. Como é que surgiu a ideia e como é que tem sido até aqui os últimos meses?
João Ribeiro Telles – Surgiu, como disseste, pelos meus quinze anos de Alternativa. Queria fazer alguma coisa diferente. Eu não sou tourear muitas corridas, mas este ano optámos por ter apenas 15 corridas. O objectivo era ser diferente, mais do que propriamente pelo número de corridas. E sem dúvida que tinham que ser 15 corridas especiais, algumas especiais pelos cartéis, outras pelas datas, outras pelas praças. Mas coisas especiais e importantes. E a Moita é para mim tem sido uma praça bastante importante nos últimos anos. Uma corridas de seis toiros estava na ideia, estava porque a quadra estava mobilizada e acima de tudo é um desafio comigo mesmo. E é na Moita por ser tão especial e tinha que ser assim, importante. É uma feira importante e talvez mais isso, se calhar um dos dias de maior tradição, dos dias mais importantes do ano.
TeO – Vais actuar em solitário numa das corridas mais emblemáticas da Moita. Como a de terça também o é…
JRT – A Moita sem dúvida e já o tinha feito antes, em Coruche e não foi na data tradicional do 17 de Agosto… Agora é na Moita, uma data completamente de compromisso. E é uma coisa completamente diferente. Uma coisa é ser contratado para a corrida e dia tal, e outra coisa é montar uma corrida. É outra responsabilidade completamente diferente. Eu não digo ser eu a montar, é o facto dos touros estarem exigentes, o público exigente, ser a encerrona também do Aposento da Moita e sem dúvida que é tudo muito forte…
TeO – Nessa corrida, irás tourear três toiros dos que gostam mais e três dos que gostam menos (risos)…
JRT – Uma das coisas era isso mesmo. A corrida até talvez seja mais tourista do que toureirista. Não que digo que sejam melhores ou piores, mas poderia ter escolhido ganadarias mais cómodas, mas vai a minha e a do Passanha, porque têm estado presentes na minha carreira, que defendo e sinto-me bem com este tipo de encaste, que sei que muitas vezes é criticado, mas que sei que quando há transmissão no toiro, não há o tema do encaste e já tivemos esse exemplo várias vezes. Ainda o ano passado lidei uns toiros meus em Alcochete que saíram extraordinários e é o que digo, quando há transmissão e entrega, nem vamos ver qual foi o encaste.
O Prudêncio é de encaste Murube, ganadaria com a qual não estou muito identificado. Para ser sincero toureou um dois touros Prudêncio e depois, três touros completamente do aficionado. Teixeira, Silva e Castro, ganadarias que dispensam apresentação.
TeO – Acredito que seja diferente ter o espectáculo para dois ou três toiros por corrida, ou ter digamos assim, ‘números’ para seis touros. Acredito que até o teu Pai esteja focado nisso e a dar algumas ideias…
JRT – Tenta-se criatividade, o que não é fácil nos dias de hoje, está tanta coisa já inventada… mas acima de tudo o que procuro é tourear bem. Mas sem dúvida que é preciso rematar as lides de formas diferentes, mas é mesmo como disse, o que procurarei é tourear bem e o que flui naturalmente, é o que transmite mais.
TeO – Há portanto mais “Ilusões” sem ser só o “Ilusionista”…?
JRT – Sim, tenta-se sempre inovar com algo, mas até acho que é mais do pormenor, tentar um pouco ir à veia artística do meu pai, como falaste e ser uma coisa natural.
TeO – E por falar no teu Pai, vamos ter um convite para que crave um ferrito?
JRT – O convite está feito de sempre, mas o “não” também é dito logo (risos). Claro que era o que mais gostava, mas sou completamente sincero, não está nada combinado. Ele diz que não e é coisa que respeito.
TeO – Pode ser que no momento o coração assim dite…
JRT – Eu tenho mesmo medo é do coração (risos).
TeO – Acredito que não seja só o teu pai e que o teu suporte familiar e de amigos sejam um pilar importante na tua carreira…
JRT – Claro que sim. Sinto primeiramente privilegiado e depois, orgulhoso de não defraudar a confiança que as pessoas depositam em mim. Tenho realmente a sorte de ter muitos amigos e muitos aficionados e o que quero é que vão e se divirtam que é isso que é importante para nós toureiros.
TeO – 15 anos, 15 corridas mas a verdade é que vais ter um fim de temporada com grandes “apertos”. A encerrona, Coruche e Vila Franca…
JRT – Sim, a de Vila Franca é muito especial, porque é a corrida de família, a dos seis touros, por depender de mim e das minhas capacidades e o não dormir “ainda mais…” As outras foram também muito importantes, Lisboa, Salvaterra, Montijo, Abiul, Alcochete e agora esta recta final que espero seja o culminar de uma grande temporada.
TeO – Tu e o teu tio António iniciaram o ano com alguma polémica com Coruche, mas felizmente as coisas chegaram a bom porto…
JRT – Nunca disse isto publicamente, mas disse-lhe a “eles” que o comunicado que emitiram foi um pouco injusto, porque não faço ideia dos contratos do meu tio António, não faço ideia de datas e “eles” meteram tudo no mesmo saco e posso reafirmar aqui, que não toureei em Coruche mais cedo não por um euro, mas foi por datas, cartéis, não saiu, mas é natural, há muitas outras vezes em que as partes não chegam a acordo e se dissesse tudo, quase todas as semanas se emitiam comunicados.
Não tenho nada com a empresa, muito pelo contrário, até nos temos dado muito bem, espero que a corrida seja um sucesso, mas até para me defender perante o meu público, quero aqui dizer que sinto isto, sinto Coruche, vivo aqui na Quinta Grande, jogo aqui futebol e eu é que sei o que me custaria não tourear em Coruche e se tivesse que acontecer… mas dou os parabéns à empresa pelo cartelazo e espero que o público corresponda.
TeO – Estiveram para não ir e de repente vão num dos cartéis da temporada…
JRT – Sim, de facto foi uma cartada bem aproveitada pela empresa.
TeO – E acaba por ser a reactivação de uma data que em Coruche estava meio moribunda...
JRT – Espero que a força do cartel reactive a data!
TeO – Os toureiros gostam muito das datas seguras, mas não achas que vocês também têm a responsabilidade de não deixar cair datas e em consequência, praças?
JRT – Eu não sacudo a água do capote. Assim que se acerte tudo para reactivar uma data, eu sou o primeiro a estar “lá”. Eu não posso é sozinho fazer tudo. As coisas para terem força, tem que estar tudo rematado, desde o sítio, forcados, toiros… Para reactivar datas, tem que haver cartel rematado de principio ao fim, não podem ser dois melhores, com um pior e por aí fora…
TeO – Falaste numa coisa curiosa. Por vezes há dificuldade em dar a mão a alguém. Não falo de ti, generalizo… até porque tens o Tristão…
JRT – Tu sabes que no início da temporada tentei montar uma coisa com a malta mais nova e não se deu por falta de miúdos… era a minha ideia, lançar vários miúdos em novilhadas para que pudessem depois integrar outros espectáculos, e que depois pudessem actuar no fim dos espectáculos, como me aconteceu a mim, ao Moura Júnior…
TeO – Achas que mais que a questão dos anti-taurinos, os empresários deveriam investir mais nas novilhadas, como agora aconteceu em Montemor?
JRT – Não querendo defender o meu apoderado, mas a verdade é que o Ricardo Levesinho dá muitas novilhadas, mas repara que os cartéis são sempre muito repetidos por falta de toureiros. No tempo do meu avô e na Torrinha, antes aparecia sempre alguém para montar e tourear uma vaca.
TeO – Mas a minha percepção é que se vê muitos miúdos nas praças… Será que são os toureiros que fecham portas?
JRT – Não, até tenho um toureiro espanhol em minha a casa e a verdade é que tenho a porta aberta de nossa casa para vir quem quiser, porque foi assim que fui educado. No entanto também temos que perceber que para os pais o momento não é o melhor, isto tem investimento…
TeO – Achas que o delicado momento financeiro pode ser agora o “culpado” mais que propriamente os anti-taurinos?
JRT – Acho que a tauromaquia é muito maior do que falamos. Sempre que achamos que isto está para acabar aparece uma lufada de ar fresco de algum lado. Só quando corremos perigo é que acordamos.
TeO – O Pedrito foi convidado para um podcast e fez umas declarações que estão a dar que falar. Sentes que “vocês” são culpados por ser mais ou menos figuras públicas. Dou também o exemplo do João Moura Caetano porque bem ou mal, a palavra “toureiro” anda nas bocas de todos…
JRT – Por vezes é verdade que somos muito de comodismo. Mas também é verdade que também do lado de lá não dá a cara. Mas é em tudo assim, é um problema da sociedade. É mais fácil não dar a cara.
TeO – As únicas corridas televisionadas em Portugal, foi por um canal espanhol. Pensando que em cada corrida estão a contribuir para uma suposta defesa da Festa…
JRT – Falo a defender a Prótoiro. Defendo a definição Prótoiro. Mas a verdade é que não está a ser bem gerida e não está no melhor momento. Espero que a “malta” se organize mesmo. Todos sabemos que a “coisa” tem que ser de uma forma diferente.
TeO – Como vês as guerrilhas à portuguesa? És apoderado pelo Ricardo, que não se dá com o Rui Bento. Não foste à Nazaré e nem vais a Almeirim. O Luís Pombeiro não se dá com o Ricardo, o Duarte Pinto não vai a Vila Franca. Como vês essas questões.
JRT – Sei lindamente que é assim, mas coloco-me fora disso e obviamente não percebo. Estou cá para tourear, sigo o meu caminho, felizmente estou nas corridas mais importantes. Almeirim quando foi preciso lá tourear, assim foi…
TeO – Mas não achas que isso mais do que Vos prejudicar, prejudica a festa? E que nestas circunstâncias não há Prótoiro que Vos/nos valha?
JRT – Exactamente e disso não tenho dúvidas. Ainda assim falo à vontade porque eu directamente não tenho influencia nisso. Uma coisa é certa. Almeirim para mim, tem sido uma praça talismã, a corrida do Grave, a alternativa do Salgueiro da Costa, a corrida com o Diego Ventura e Rui Fernandes e o culminar foi esta última, de família, em que a praça esgotou e este ano, nem sequer fui contactado. E isso para mim dá-me força…
TeO – Mas sentes que é injusto?
JRT – Completamente injusto.
TeO – Atenção, falamos destas praças geridas por Rui Bento, mas poderíamos falar de outras. Há atritos com outros teus colegas, etc..
JRT – Os atritos fazem falta é dentro da praça. E enquanto dentro da praça conseguir dar a cara, fico satisfeito. O toiro é que manda e enquanto assim for, isto não terminará.
TeO – Falaste no toiro. No próximo ano haverá dificuldade…
JRT – Como sabes esta corrida não estava pensada e foi um filme para arranjar toiros…
TeO – Temes que no próximo ano possa haver muitos confrontos e muitos concursos de ganadarias?
JRT – Agora falo-te como ganadeiro. Os anos foram difíceis para nós e isto é só mesmo paixão, como sempre foi. Temos é que dar os parabéns a quem ainda mantenha a criação do toiro bravo.
TeO – Mas a verdade é que os responsáveis pelo Turismo têm dificuldade em colocar em prática o toiro como produto turístico o que seria uma rentabilidade. Só duas ou três ganadarias portuguesas é que fazem isso.
JRT – Eu tenho que estar preparado para isso. Para se vender essa vertente do turismo, as coisas têm que estar bem montadas, preparadas e com categoria para isso…
TeO – Quatro corridas, quatro desafios, mas principalmente a Moita…
JRT – Será um final de época arrasador. Mas o que peço é no fim dizer que foi arrasador. Quero muito sair de cada corrida feliz, mas também que todos os que irão ver, possam sair felizes.